terça-feira, 23 de agosto de 2011

Aos alunos e colegas professores da rede pública estadual do Ceará:



Venho aqui desabafar meus sentimentos em relação às últimas declarações do Sr. governador Cid Gomes acerca da greve dos professores do Estado, que já ultrapassa sua segunda quinzena, e tem nos trazido muita indignação e tristeza. É deplorável a falta de respeito e de importância, dada à educação, por parte dos governantes.
Ontem (22.08.11), em Camocim, Cid, diante de uma comitiva de professores grevistas, indagou:
-Por que vocês fizeram concurso? Por que não foram para a escola privada? (...) Por mim, nem carreira existiria!
-(...) A escola privada é melhor. É para lá que vocês deveriam ir!
Anteriormente, em outro momento, o mesmo já havia declarado:
-O professor tem que dar aula por gosto; não pelo salário. Se quer ganhar mais, vai para a escola privada!
A arrogância e o desrespeito foram indignadores. E, para completar, no mesmo dia, a TV Ceará (TVC) reprisou um programa de entrevistas com a presença do irmão do governador, Ciro Ferreira Gomes. Na entrevista, Ciro declarava que “greve só AVACALHA a situação da educação e SACRIFICA o filho do pobre”. Avacalhar e sacrificar! Será que os irmãos Ferreira Gomes realmente entendem o sentido dessas palavras? Pergunto-me. Será que o aluno da rede pública, “o filho do pobre”, como ele mencionou, já não é sacrificado todos os dias letivos do ano? Primeiro: por ser pobre. Por viver em condições precárias, em virtude da falta de uma política honesta e igualitária, que garantisse condições dignas de vida para todos; segundo: pelas péssimas condições físicas e estruturais das escolas, onde o aluno é obrigado a passar uma manhã inteira sentado em uma carteira inadequada ao seu tamanho e desconfortável à sua coluna (isso quando há carteiras!); passar 5, 6 horas do dia em salas sem ventilação, sem limpeza, servindo-se de uma merenda escolar de baixa qualidade (ele que, muitas vezes, por ser “o filho do pobre”, já não tem uma alimentação nutritiva em casa, e não tem o direito a tê-la nem mesmo na escola); terceiro: por não ter acesso a um transporte escolar e, por isso, muitos são obrigados a caminhar horas e horas para chegar à escola. Sem falar na presença, em sala, de um professor desestimulado pelo desrespeito e pela má remuneração. Porque não há ninguém, nenhum ser humano na terra que se sinta feliz com seu trabalho, se não houver estímulos para isso. Não é dar aula por gosto (como disse o governador), mas ter gosto para dar aula. E isso só aconteceria se o governo parasse de “avacalhar” a educação e de “sacrificar” alunos e professores. E compreendesse que a educação é a chave para milhões de portas que se abrirão no futuro, que ela é a base para a construção de uma sociedade sólida e de uma nação forte. E que todos os países do chamado “Primeiro Mundo” estão lá porque sabem disso e porque priorizam essa questão. Na Europa e na Ásia, por exemplo, professores pós-graduados são muito bem remunerados para estar em salas de aula da educação básica, preparando seus alunos para chegarem com bom nível na universidade e, assim, produzirem bons profissionais que serão valorizados no mundo todo. O próprio governo do Estado, recentemente, inaugurou o terminal de múltiplo uso do porto do Pecém, cuja tecnologia da obra é toda de responsabilidade de uma empresa japonesa. Nós importamos profissionais de outros países porque o governo não investe em educação!
E por que insistir em mandar os professores que lutam por um salário mais digno para a escola particular? Não seria melhor e mais correto investir na escola pública e no profissional desta escola? Não seria esse o papel do Estado, Sr. Cid? Como podemos estar “avacalhando” a educação se ela já vem sendo avacalhada pelos governantes faz tempo? Afinal de contas, o piso salarial porque brigamos já é uma luta histórica, não faz parte da modernidade! É ridícula a maneira como os governos vêm coordenando isso! Estão sempre deixando de molho questões importantes e imediatas. Até quando?
Mas, apesar de toda essa sujeira, tenho visto algo que tem me alegrado bastante: o crescente apoio dos estudantes na luta pela valorização do professor. Isso é uma inovação em nosso histórico grevista, pois o mais comum sempre foi ver alunos contrários aos movimentos, inconformados por serem os principais prejudicados. Mas isso também é a prova de que eles mesmos não aguentam mais tanta injustiça e desrespeito. E, principalmente, é a prova de que, ao contrário do que pensa o governador, o trabalho dos educadores do estado do Ceará está sendo bem feito sim. Estamos formando cidadãos críticos, com consciência de classe. Isso deve incomodar profundamente os governantes. Aliás, por falar em trabalho bem feito, em 2007 e 2009, o Ceará atingiu a primeira colocação do IDEB (Índice de Desenvolvimento da Educação Básica) no Norte/Nordeste. Ou seja, por duas vezes, o Ceará é considerado o melhor do Norte/Nordeste e o 6º melhor estado do Brasil em educação. Isso é quase inacreditável, se pensarmos que temos aqui também os educadores com o 5º pior salário do país. No entanto, é mais uma prova de que, mesmo mal pagos, executamos bem a nossa parte. E por que o governador não lembra disso? Só lembra de dizer asneiras, do tipo: “servidores públicos que não têm compromisso com o trabalho, deveriam ser demitidos pelo Estado”. Se isso acontecesse mesmo, a primeira providência do nosso ilustre governador deveria ser redigir sua própria carta de demissão. Pois um governante que não pensa e não age responsavelmente diante de uma situação tão delicada, sem dar a ela a devida importância, não deveria ocupar o posto que ocupa.
Sem mais a declarar e diante de tal realidade, aos queridos alunos, peço que continuem nos apoiando nesta luta, pois este apoio é fundamental, uma vez que esta batalha também é por vocês. Aos colegas educadores, força e determinação. Não podemos e nem devemos desisitir. O fim de toda essa política fascista deve estar próximo. E que as próximas eleições possam refletir o resultado deste aprendizado.

Abraço,

Prof.ª Márcia de Oliveira.
EEFM Albaniza Rocha Sarasate.

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